Direito Ao Afeto : Pavilhão Victor Brecheret - Parque da Catacumba, RJ
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Ademar Marinho, da série Mulheres Negras Não Recebem Flores [Women of Color Don't Receive Flowers series], 2021Oil on canvas70 x 50 x 4 cm / 27.56 x 19.69 x 3.15 in
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Ademar Britto, da série Mulheres Negras Não Recebem Flores [Women of Color Don't Receive Flowers series], 2021Oil on canvas70 x 50 x 8 cm / 27.56 x 19.69 x 3.15 in
Música sem letra
Expressar o sentimento sem palavras?
O que se move dentro quando não há referência escrita — e, por isso mesmo, não há definição, não há limite?Talvez seja preciso desaprender a nomear.
Não colocar.
Deixar o vento entrar.Música sem letra é sopro.
É som que toca sem dizer.
É o intervalo entre uma nota e outra que sustenta o que sentimos sem precisar explicar.E quem disse que o sentir precisa ser explicado?
O silêncio?
Não exatamente.
Talvez seja escuta.
Talvez seja pausa.
Talvez seja só a coragem de não preencher o espaço.Música sem letra nos oferece outra forma de compreender:
O afeto existe.
Ele não é dito.
Mas se faz presente.
Como o gesto que não exige retorno.
Como o olhar que permanece mesmo depois de virar o rosto.Não se trata de dizer, mas de sustentar.
Não se trata de definir, mas de deixar existir.
Música sem letra é linguagem do corpo e do tempo.
É onde o afeto respira.
Direito ao Afeto
por Keyna Eleison
Esta exposição começou a ser sonhada em um tempo em que o mundo estava suspenso. Durante a pandemia, entre incertezas e reclusões, nasceu a ideia de apresentar o trabalho de Panmela Castro em uma mostra que abordasse o afeto como gesto e como ruptura.
A exposição foi inicialmente pensada para acontecer no espaço do Jacarandá, na Villa Aymoré, no Catete — um lugar que, assim como esta proposta, resistiu ao tempo. O que era para ter acontecido antes, só agora se realiza. E talvez por isso mesmo, ela carrega em si a força de quem atravessou o adiamento sem perder o ímpeto de florescer.
O Jacarandá é, por si só, uma afirmação de permanência. Fundado em 2014, sob a liderança de Carlos Vergara, é uma iniciativa coletiva de artistas e amantes da arte, sem fins lucrativos ou comerciais. Desde então, tem mantido seu compromisso com a ampliação dos espaços da arte e do pensamento de forma independente, generosa e crítica. Receber Panmela aqui, agora, é uma celebração dessa resistência comum — da arte que insiste, da ideia que retorna, do afeto que se realiza no encontro.
Na obra de Panmela Castro, o afeto não é um gesto óbvio. Ele está longe de ser leve ou automático. Por isso, o afeto, aqui, se torna um campo de disputa. E também de construção.
Panmela parte de uma experiência simples: receber flores. Um gesto frequentemente associado à delicadeza, ao cuidado, ao romantismo. Mas ela não para aí. Responde a esse gesto com outro — pinta as flores. A pintura, nesse caso, não é só imagem ou tradução visual. É ação. É elaboração. É transformação de um símbolo em prática, de um oferecimento em escolha, de uma emoção em construção estética e política.
Nesta exposição, o gesto de pintar flores não representa uma idealização romântica do afeto, mas sua recodificação como possibilidade de cura, autonomia e reciprocidade. Ao pintar as flores que recebe, Panmela se recusa a apenas agradecer. Ela devolve. E, ao devolver, afirma. Afirma que o afeto não é um luxo: é um direito. E mais do que isso, é uma estratégia.
O afeto, em sua obra, é convocado como força que mobiliza estruturas e é base na organização da autoestima. Não é íntimo apenas — é público. É coletivo. E é político. Está no gesto de cuidar de si, mas também no gesto de sustentar outras, de olhar para as que vêm depois, de construir pontes onde antes só havia isolamento. O afeto, nessa dinâmica, se alia à construção de saúde e educação. Ele é força de base: um terreno sobre o qual se pode erguer autonomia, visão de futuro e transformação social.
A autoestima, aqui, não é vaidade: é fundação. É a sedimentação de um saber que nos foi negado — o de que podemos, sim, fazer, criar, liderar, ensinar, existir de forma plena. O afeto funda o possível. Funda a confiança. Funda a ação.
E, é nesse espírito que, como curadora, reivindico o gesto do afeto sem a obrigatoriedade da resposta. As flores que envio para Panmela não são pedidos, nem cobranças. São flores para que ela não se sinta obrigada a nada. Flores para que ela possa apenas receber, se quiser, no tempo em que quiser, com a liberdade de não retribuir. Porque o cuidado também é isso: oferecer sem exigir. Criar um espaço onde a presença possa florescer sem dever. Onde o afeto não se torne fardo, mas possibilidade.
Panmela nos lembra, com suas flores e suas tintas, que criar também é cuidar. E que cuidar, nas margens de uma sociedade excludente, é um ato revolucionário. Suas pinturas não são ornamentos. São respostas. São afirmações de presença. São sementes lançadas no tempo para florescerem em outras mãos, em outras vozes, em outros corpos que também escolheram — ou estão aprendendo a escolher — viver com afeto como verbo político.
Keyna Eleison
Exposição: Direito ao Afeto Período da exposição: 27/04 a 02/08/25
Visitação: terça e sexta (11h e 15h, com agendamento). Sábado e domingo (de 10h às 16h)
Local: Pavilhão Victor Brecheret, Parque da Catacumba - Av. Epitácio Pessoa, 3000 - Lagoa, Rio de Janeiro - RJ, 22471-003
- Quem quiser participar, pode enviar flores para a galeria.
- Anyone who wishes to participate can send flowers to the gallery.
Endereço para envio de Flores | Adress to send flowers:
Pavilhão Victor Brecheret, Parque da Catacumba - Av. Epitácio Pessoa, 3000 - Lagoa, Rio de Janeiro - RJ, 22471-003
PANMELA CASTRO CONVIDA O PÚBLICO A PENSAR O AFETO COMO DIREITO EM NOVA EXPOSIÇÃO NA LAGOA
No Parque da Catacumba, artista apresenta obras inéditas, pinturas ao vivo e uma convocação política: o cuidado como reparação simbólica e práticas de construção de um futuro sustentável.
A partir de 27 de abril de 2025, a artista e ativista Panmela Castro ocupa o Pavilhão Victor Brecheret no Parque da Catacumba, na Lagoa, com a exposição “Direito ao Afeto”, com curadoria de Keyna Eleison. A mostra propõe um gesto coletivo e transformador: flores que chegam à galeria, enviadas pelo público, são transformadas em pintura ao vivo pela artista — um ritual de escuta, cuidado e presença.
Inspirada em um manifesto elaborado por Panmela, a exposição parte da seguinte premissa: “O afeto não é privilégio — é um direito fundamental.” A frase sintetiza um percurso iniciado anos antes com a série “Mulheres Negras Não Recebem Flores”, nascida após a viralização do texto da escritora Gabriela Moura, que denunciava a exclusão afetiva de mulheres negras.
Ao pintar flores que lhe são ofertadas, Panmela subverte esse gesto antes negado, transformando-o em obra. As pinturas, realizadas ao longo da exposição, fazem parte de uma ação contínua e aberta ao público, que pode participar ativamente do processo. Em alguns sábados e domingos, a artista estará presente no espaço, realizando pinturas ao vivo, em diálogo com visitantes. Flores podem ser enviadas diretamente à galeria.
Além das pinturas em tempo real, a programação inclui rodas de conversa sobre afeto, solidão e representatividade, e sessões de modelo vivo botânico, em que flores substituem o corpo humano como objeto de observação e inspiração — uma proposta poética para pensar a beleza, o efêmero e o pertencimento.
“Sou uma mulher negra, e por muito tempo fui ensinada a não esperar cuidado. Essa exposição é uma forma de dizer que merecemos afeto, sim. E que merecemos recebê-lo em vida, em público, em gesto. Flores são só o começo”, afirma a artista.
Direito ao Afeto também se conecta a discussões contemporâneas sobre os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis) e justiça climática. Segundo dados da ONU, mulheres negras e indígenas são as mais afetadas pelas crises ambientais. Ao posicionar o afeto como direito, Panmela propõe que cuidar de pessoas e cuidar do planeta são práticas interligadas — inseparáveis em qualquer projeto de futuro.
Instalada em um parque ecológico com vista para a Lagoa Rodrigo de Freitas, a exposição propõe um percurso sensível em meio à natureza, convidando o público a desacelerar e refletir sobre o que significa ser visto, celebrado e cuidado.
SERVIÇO
Panmela Castro - “Direito ao Afeto”
Curadoria: Keyna Eleison
Abertura: 27/04/2025 das 14h às 16h
Exposição: até 02/08/2025
Local: Pavilhão Victor Brecheret, Parque da Catacumba – Av. Epitácio Pessoa, 3000, Lagoa, Rio de Janeiro – RJ, 22471-003
Realização: Jacarandá Art Clube, Lagoa Aventuras, Panmela Castro Cultura e Arte
Parceria: Rede NAMI
Visitação: Terças às sextas (11h e 15h, com agendamento) | Sábados e domingos (10h às 16h)
Classificação: Livre
Entrada Gratuita.
Programação gratuita:
– Pinturas ao vivo por Panmela Castro
– Conversas abertas sobre afeto, solidão e pertencimento
– Sessões de modelo vivo botânico para o público participar pintando
– Envio de flores: Durante a exposição, o público é convidado a presentear Panmela Castro, enviando flores à galeria através de envio para: Balcão Lagoa Aventuras, Parque da Catacumba. Av. Epitácio Pessoa, 3000 – Lagoa, Rio de Janeiro – RJ, 22471-003
Mais informações:
Tel.: (21) 97183-2399